O governo do Egito anunciou que irá realizar uma reunião no sábado (21) com o objetivo de solicitar um cessar-fogo em Gaza e encontrar uma maneira de fornecer ajuda humanitária aos palestinos. Foram convocados os poderes regionais e os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
Tanto os americanos quanto os europeus desejam que os egípcios abram a fronteira com Gaza, principalmente para receber seus próprios cidadãos e estrangeiros em geral. Eles também querem que o Egito acolha os palestinos que estão fugindo dos bombardeios e da escassez de alimentos.
No entanto, não há informações sobre como seria possível o êxodo para o Egito, estimativas de quantas pessoas atravessariam a fronteira e nem quem arcaria com os custos iniciais de abrigar os refugiados no Sinai (região egípcia que faz fronteira com Gaza e Israel). Além disso, não há planos para lidar com as consequências dessa nova expulsão em massa de palestinos de suas terras.
O Egito reluta em receber os palestinos, pois não tem meios para cuidar deles e teme a entrada de membros do Hamas, da Jihad Islâmica ou de seus sucessores, bem como tem receio de uma ocupação permanente de partes de Gaza por parte de Israel.
O problema mais imediato é determinar quantos refugiados estão envolvidos. Seriam 250 mil? 500 mil? O milhão de pessoas que habitava o norte de Gaza, marcado para morrer por Israel? E o outro 1,2 milhão?
Supondo que isso seja possível, que a ONU ou outras entidades recebam recursos financeiros para fornecer abrigo, comida e água para centenas de milhares de pessoas no deserto do Sinai. Mas o que aconteceria com os demais palestinos?
Em teoria, Gaza continuaria a ser sitiada e atacada até o Hamas ser aniquilado, de acordo com os interesses do governo de Israel.
Israel decide se Gaza terá eletricidade (por transmissão direta ou fornecendo diesel para a única usina elétrica da região). Israel decide se Gaza terá água (que vem de Israel, de poços ou de processos de dessalinização, dependendo da eletricidade). Israel decide se os comboios de ajuda que estão atualmente parados no Egito podem entrar em Gaza e, no mínimo, estão sujeitos a serem vítimas colaterais de bombardeios israelenses.
Supondo que, após a “aniquilação” do Hamas, a guerra seja interrompida por semanas ou meses, para onde os palestinos voltariam? Uma parte significativa de suas casas, hospitais e serviços públicos teria sido destruída. Onde eles trabalhariam? Apenas 35% da população está no mercado de trabalho (com emprego ou em busca de um, enquanto no Brasil esse número é de cerca de 61%). Após a destruição, a situação seria ainda pior.
Os palestinos teriam energia elétrica e água fornecida por Israel? Seria permitido que eles deixassem Gaza? No ano passado, Israel permitiu apenas 1.163 saídas de palestinos de Gaza, em média por dia (sendo que a maioria dessas pessoas eram trabalhadores temporários); o Egito permitiu apenas 397. As importações palestinas são controladas por Israel (que teme a compra de materiais para a construção de armas e bombas, por exemplo, mas não apenas isso).
Ou seja, na melhor das hipóteses, os palestinos de Gaza voltariam para a mesma prisão, porém em um estado mais destruído. Sob qual governo? Sob o controle de um possível Hamas 2º?
Quem controlaria Gaza? Talvez uma tropa temporária de Israel. E depois disso? Quem reconstruiria a região, de que forma e com que capacidade de impor ordem no território?
A possibilidade de êxodo para o Egito pode reduzir o número de mortes. Dadas as circunstâncias de horror, isso talvez seja o melhor que se possa esperar no momento. No entanto, isso não diminui o risco de massacre para aqueles que permanecerem em Gaza e também não oferece uma solução para o desastre humanitário e político da região em longo prazo. Assim como os poderes ocidentais e regionais não tinham um plano ou interesse em resolver a desgraça dos palestinos antes da nova guerra, agora também não possuem soluções viáveis.
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e informe que a fonte deste artigo é https://www1.folha.uol.com.br/colunas/viniciustorres/2023/10/fuga-para-o-egito-pode-evitar-mais-morte-em-gaza-mas-nao-e-solucao.shtml